Ruptura de Cisto de Ovário em Paciente com Leucemia Aguda

Maria Tereza Machado de Paula

Luiz Carlos Rubim

Glauce Mattos

Renato Pretti

Heloisa Helena Arantes Gallo da Rocha

 

Rev. Inst. Est. Hem. “Arthur de Siqueira Cavalcanti”,11(1/2): 25-27,1994

 

ABSTRACT

A female patient came to the Emergency Unit of Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro in March, 1994, because a collapse and an acute abdomen syndrome were diagnosed. She had been treating for an acute myeloid leukemia since December, 1993 and she was considered in remission, but was with aplastic bone marrow because recent chemotherapy regimens. She was submitted to a surgery and it was observed that she had a ruptured ovarian cyst. She had it excised and during the post operation period she received support therapy with antibiotics, blood transfusions and growth factors agents. She had an excellent evolution and was discharged   a week later. The authors discussed about the literature experience in surgical complications during leukemia acute treatment.

 

INTRODUÇÃO

Grandes cirurgias em pacientes com leucemia aguda são habitualmente evitadas devido a alta mortalidade1.De acordo com Kuffer et al 2a, em 12 de 259 crianças com leucemia que desenvolveram complicações em que haveria a necessidade de cirurgia,das 3 crianças operadas, uma sobreviveu. Por outro lado, o tratamento conservador nesses casos apresenta também mortalidade muito alta 3. Com o avanço das técnicas de suporte, principalmente hemoterápicas e antibioticoterapias adequadas, estes pacientes com indicações de cirurgia geral tem suportado o stress cirúrgico com menores índices de complicações.

O objetivo deste trabalho é relatar um caso de abdome agudo em uma paciente com leucemia aguda.

 

RELATO DO CASO

Trata-se de uma paciente de 26 anos, negra, solteira, cuja primeira consulta no Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro (IEHE) foi em dezembro de 1993. O diagnóstico citomorfológico e citoquímico foi compatível com leucemia aguda mieloblástica (LAM), M52 segundo a classificação FAB. Iniciou esquema quimioterápico, conforme protocolo adotado no Serviço de Hematologia Clínica do hospital. Em 3/03/1994, um aspirado de medula óssea foi compatível com remissão completa da doença.Em 20/03/1994 deu entrada no Setor de Emergência do IEHE com choque hipovolêmico.A mãe relatava que a paciente estava bem até que “desfaleceu” subitamente. Referia amenorréia há 2 meses, mas negava coitos recentes.Ao exame físico de entrada, mostrava-se lúcida, com intensa palidez cutâneo mucosa, anictérica, apirética e taquicárdica. Apresentava importante hipotensão ortostática e lesões orogengivais consistentes com candidíase. O exame abdominal apresentava sinais de defesa com dor a palpação superficial. Foi contacto o cirurgião geral do Hospital Souza Aguiar que confirmou quadro de abdome agudo e transferiu-se a paciente para aquele hospital. Chegou à sala cirúrgica com choque hipovolêmico, tendo sido já instituída reposição volêmica e medicações hipertensoras. A ultra-sonografia abdominal feita pouco antes da cirurgia revelou grande quantidade de líquido peritoneal com ecogenicidade sanguínea. Antes da cirurgia seu hemograma de entrada revelou leucometria de 300 leucócitos/mm3,hematócrito:19%;hemoglobina: 6,3 g/dL e contagem de plaquetas: 19 300/mm3. Recebendo Imipenem e GC SF . Constatou-se ruptura de cisto de ovário no ato cirúrgico. No dia seguinte a cirurgia foi transferida de volta para o IEHE, mantendo-se a medicação antibiótica e estimulante da produção leucocitária.Houve melhora progressiva do quadro e a paciente recebeu alta em 30/03/1994.Prosseguiu tratamento quimioterápico ambulatorialmente, estando atualmente em remissão clínica e hematológica.

 

DISCUSSÃO:

A incidência de complicações cirúrgicas em pacientes com leucemia aguda é desconhecida. Segundo Kuffer et al 2a a incidência é em torno de 4,6%, enquanto que para Prolla et al3 é de 9,5%. Bjornsson et al4 relataram a necessidade de grande cirurgia em 9 de 108 pacientes com LAM. De acordo com estudos clínicos cirúrgicos e anátomo- patológicos, a maioria dos pacientes desenvolve doença na região íleo-cecal2-4 .

O progresso no tratamento de suporte e quimioterápico durante a indução de remissão na leucemia aguda pode torna factível a realização de cirurgias de emergências nesses pacientes, como demonstrado no caso aqui relatado.

A terapia profilática de plaquetas, administração de antibioticoterapia eficaz e o uso de estimulantes da produção de granulócitos permitem uma diminuição na mortalidade e morbidade neste tipo de complicação em pacientes com leucemia aguda.

 

* Chefe da Seção de Clínica Hematológica do Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro

** Médicos da Seção de Clínica Hematológica do Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro

*** Médico Estagiário da Seção de Clínica Hematológica do Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro

**** Chefe do Serviço de Clínica do Instituto Estadual de Hematologia do Rio de Janeiro.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1-      Bjornnsson, S: Yates,J et al.- Major Surgery in acute leukemia. Cancer, 34:1272-75, 1974.

2a   Catovsky D, Bennet JM, Daniel MT et al: Proposals for the classification of the acute leukaemias. French- American- British (FAB) co-operative group. Br J. Haem.     33:451-8; 1976.

2-      Kuffer,F;Fortner,J, Murphy,M- Surgical complications in children undergoing cancer therapy. Ann. Surg., 167: 215-9; 1968.

3-      Prolla, JC, Kisner,ND: The gastrointestinal lesions and complications of the leukemias. Ann. Intern. Med., 61:1084-103, 1964.

4-      Seligman,BR, Rosner,F et Ritz, ND: Major surgery in patients with acute leukemia. Am. J. Surg., 124:629-33, 1972.